PÁG. 136, agosto de 1997.

Bola, bunda e batucada

Daniel Piza

"Fica-se definitivamente seduzido, quando elas marcham com um movimento intermitente das ancas, cheias de misteriosas confidências, que nos conduzem à perturbação dos sentidos", afirmou um visitante francês sobre as negras e mulatas brasileiras em 1850. Vai esta transcrição como um dos atrativos de Viagem pela História do Brasil, CD-ROM e livro de Jorge Caldeira, com textos de Sergio Goes de Paula e Claudio Marcondes (Companhia das Letras).

O espanto — resultando ora em fascínio, ora em repúdio — dos estrangeiros pela libertinagem tropical é freqüente no produto. Como História da Vida Privada no Brasil, ele mostra o processo peculiar e atravancado da colonização do país e da formação de sua identidade imprecisa e ambivalente. Vemos nascendo ali o país dos três Bs (bola, bunda e batucada) e também uma sociedade essencialmente ocidental que, embora pareça caminhar para o capitalismo democrático, em tantos momentos retrocede para uma economia fechada e isolada. Isso não deve entusiasmar os seguidores-deturpadores de Gilberto Freyre e Sergio Buarque de Holanda, que acreditam que vivemos num inédito arranjo democrático da História.

Mas o livro não é uma análise sociológica; está mais para um almanaque colorido, amplo e superficial. O CD-ROM tem momentos divertidos, como a animação feita com as estátuas de cedro de Aleijadinho ao som de uma missa barroca e o primeiro samba gravado, Pelo Telefone. A execução editorial e tecnológica é primorosa. Faltam mais recursos lúdicos e maior qualidade informativa. O jeito é sentar e ver o bonde da História passar. Ou dar para o seu filho em idade escolar.